[A ESTA HORA DA NOITE]
[a esta hora da noite, não há quem possa conversar sobre poesia inglesa, ou sobre os hábitos de walter benjamin em paris, ou sobre a vida de augusto dos anjos em leopoldina, minas gerais. um amigo disse, no tempo em que os amigos conversavam a esta hora da noite: "o rosto dos escritores impregna-se do que escrevem, e as rugas são traços e textos em palimpsesto na carne do rosto". a esta hora da noite, o amigo que tal coisa disse não vive mais neste mundo, e há o silêncio, e há o rosto de textos nele impregnados, e há o buraco das conversas que já não acontecem a esta hora da noite. a esta hora da noite, não há quem possa conversar sobre o ativismo de grace paley, ou sobre a lata de atum que kerouac comia, antes de morrer, ou sobre o silêncio entre joyce e proust em certo banquete, sobre os livros que joubert jamais publicou ou sobre a infância de edmund jabès no cairo. a esta hora da noite, o telefone não toca para a leitura do conto recém-escrito, a bomba de nêutrons dizimou...