[é quase noite. e as pitangas
tingem o leite que o céu
derrama a oeste, ali onde a estrela
temporã logo virá declamar
um poema de francis ponge.
o vapor de cachoeira
o vapor de cachoeira
não navega mais no mar.
o jardim protege uma ninhada
de vogais. o rústico graveto
aresta a página de uma avenca
que, quase noite, logo vai
declamar um poema de francis ponge.
é quase noite ao sul do sul, vai
é quase noite ao sul do sul, vai
agora o sol, vem a lua, e o cheiro
do óleo diesel é o próprio
coração do diabo a bater
na caldeira da fábrica. a fábrica
não vai declamar
um poema de francis ponge.
o corte no olho do cão andaluz.
o corte no olho do cão andaluz.
o banquete dos mendigos
por entre as espirais
do tabaco de buñuel.
godard recorta o senso
godard recorta o senso
comum com as tesouras
de uma andorinha perdida,
perdida e cega,
na quase noite. a andorinha
logo declamará
um poema de francis ponge.
"fracassamos", diz o homem
"fracassamos", diz o homem
velho à beira de um canteiro.
"fracassamos", dizem
os leitores e as leitoras
do não à beira
das páginas mortas. e o gato,
gato sem nome, subnutrido,
triste, logo vai declamar
um poema de francis ponge.]
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