[O ANIMAL SCRIPTUS]
[sei que, entre os animais
de raridade extrema, o scriptus
tem sido ignorado pelos séculos
afora até mesmo pelos mais bondosos
cultores de bestiário. alegam ser
ele dotado de uma sombra espessa
que impede a passagem da luz,
a luz que lhe pudesse dar brilho,
e por conseguinte algum atrativo,
razão de sua insignificância
científica, ou mesmo estética,
para não dizer poética. ou anedótica.
não chego a discordar de tal
classificação negativa. essa sombra,
de fato, acompanha o scriptus. e mais:
assemelha-se a uma mortalha.
e ainda mais: a ausência de focinho,
as orelhas coladas à cabeça,
a cauda sem pêlos, os olhos de um cinza
lúgubre, tudo isto faz dele
um espécime para passar despercebido.
mas como poderia ignorar o canto,
a massa de som que o scriptus reproduz
à noite, já perto da madrugada,
canto parente de um saxofone?
como não se emocionar com a forma
doce que esse canto ou cântico
ecoa, vai pelo vento, embaralha-se
nas árvores, contorna as montanhas,
ou então segue à flor das águas
de um rio ou de um lago?
abstraio-me da aparência sem atributos
do scriptus e concentro-me em sua música.
talvez as sereias tenham com ele aprendido
a arte da sedução pelo canto. talvez
os poetas, tão primitivos, roubem
do scriptus desde o princípio dos tempos
as modalidades diversas da alta poesia.]
de raridade extrema, o scriptus
tem sido ignorado pelos séculos
afora até mesmo pelos mais bondosos
cultores de bestiário. alegam ser
ele dotado de uma sombra espessa
que impede a passagem da luz,
a luz que lhe pudesse dar brilho,
e por conseguinte algum atrativo,
razão de sua insignificância
científica, ou mesmo estética,
para não dizer poética. ou anedótica.
não chego a discordar de tal
classificação negativa. essa sombra,
de fato, acompanha o scriptus. e mais:
assemelha-se a uma mortalha.
e ainda mais: a ausência de focinho,
as orelhas coladas à cabeça,
a cauda sem pêlos, os olhos de um cinza
lúgubre, tudo isto faz dele
um espécime para passar despercebido.
mas como poderia ignorar o canto,
a massa de som que o scriptus reproduz
à noite, já perto da madrugada,
canto parente de um saxofone?
como não se emocionar com a forma
doce que esse canto ou cântico
ecoa, vai pelo vento, embaralha-se
nas árvores, contorna as montanhas,
ou então segue à flor das águas
de um rio ou de um lago?
abstraio-me da aparência sem atributos
do scriptus e concentro-me em sua música.
talvez as sereias tenham com ele aprendido
a arte da sedução pelo canto. talvez
os poetas, tão primitivos, roubem
do scriptus desde o princípio dos tempos
as modalidades diversas da alta poesia.]
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