[VARIAÇÕES DE VIOLONCELO NA BOCA DA NOITE]

[entre o lobo e o cão, à boca da noite, 
quando o lusco-fusco, 
na hora da alma-de-gato, 
quando o dia fecha o opúsculo, 

às vésperas das noitecências, assim
no momento em que os grilos,
é a hora dos capotes, hora de dar à cabeça
a boina, é quando a fervura da sopa,

hora da meia-luz nas platibandas, 
é quando o boi resmunga, 
a hora dos meninos ao banho,
é hora impropícia às agulhas,

hora de não enxergar as letras,
é a cor do burro fugido, 
é a estreia dos gatos pardos,
aos ninhos os passarinhos,

cordas ões dos violoncelos, 
ah, as torneiras metafísicas, 
os ohs, os ahs e os uhs, o odre
com o gigante dentro, é o vau

do onde para o aonde, é a travessa
da ponte-pênsil, que venha então a noite,
o mundo é vinho, talvez conhaque,
talvez um tango, sibila o silvo

da serpente, a vida é sinuosidade,
às favas com a poesia, é o assalto
dos pirilampos, jardel-o-torna-viagem,
essas almas originárias do minho,

é engodo que minas existe, não
existem os mineiros, há fungos
nessas paredes, pois que venha a madrugada,
haja povoação das alcovas, é a hora

do vaza-luz, escorre o claro nas frestas,
cavalos apontam na estrada,
posto que mais um dia, outro dia,
a hora é a da noite fechada.]

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