[EPIGRAMAS AO VENTO]


[eis os epigramas: 
cápsulas, 
partículas,
ciscos, 
farelos, 
migalhas.]

..**..

[houve 
então o estouro 
das gabirobas. 
os que nelas pisavam,
elas tão maduras, 
eram bois, 
lobos, onças 
e fantasmas.]

..**..

[a frase rasa 
só chega, 
quando chega, 
a leitores rasos.]

..**..

[tsunamis 
de gentes 
que os algoritmos 
querem 
nos impor 
como amigos.]

..**..

[estranho 
tipo de relâmpago: 
ao meio-dia, 
com sol em riste.]

..**..

[e 
este 
silêncio? 
tem 
nome?]

..**..

[“o tal meio literário 
me amedronta tal 
e qual me sentiria 
amedrontada 
se tivesse de tratar 
com um banqueiro, 
com um delegado 
de polícia, 
com aqueles gritadores 
em pregões 
de bolsas 
de valores”, ela disse.]

..**..

[“quem disse 
que o texto 
não iria doer?”, 
ela perguntou.]

..**..

[escrever 
ou 
incisar?]

..**..

[exaustos 
estão os ouvidos. 
e também os olhos. 
só a língua 
está calma, 
posto 
que em silêncio.]

..**..

[o mundo em cambalhotas: 
o altíssimo capitalismo, 
com as suas big-redes, 
suas big-aranhas, 
algoritmicamente 
reivindica 
o direito de mentir.]

..**..

[eram seis laranjas. 
belas laranjas. 
luzidias laranjas. 
tão redondas laranjas. 
concisas laranjas. 
felizes 
ficaram 
os que se fartaram 
com os seus gomos 
estalantes. 
fim da história.]

..**..

[vejam só 
as samambaias,
tão antigas
quanto o mundo.]

..**..

[as boas 
intenções 
de um jornal 
quase 
sempre têm 
segundas 
e obscuras 
intenções.]

..**..

[presumo que, 
pelo troar 
dos acontecimentos, 
pela pane na racionalidade, 
pela cisão nos aparelhos 
cognitivos, a humanidade 
não atravessa 
os seus melhores dias.]

..**..

[não foi 
nem seria lida, 
mas a palavra lá 
ficou, sozinha, 
ao sol, 
em cima da pedra.]



Comentários