Uns anjos do sol, da chuva e do
frio, anjos catadores de papel, conversavam hoje com Franz Kafka pelos baixios
do ribeirão Arrudas.
Falavam de virabrequins, estrelas, onças e livros
despedaçados, contavam de cachorrinhos mortos e seus melancólicos féretros de
solidão pela água abaixo, cachorros também anjos que a cidade não viu,
cachorros cujas mortes não tiveram sequer a palavra de um poeta ou o relâmpago
de uma noite sem lua.
Franz Kafka ouvia atento o relato desses anjos do sol, da
chuva e do frio, anjos catadores de papel pelos baixios do ribeirão, ribeirão
que já foi um rio.
Um ou outro helicóptero fazia de quando em quando voos de
ave sem asas por cima desses anjos, anjos caídos desde tempos já perdidos na
memória, cada um deles com um pássaro no lugar do coração, cada um deles leitor
das coisas que a cidade já parou de ler.
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